[INVENTÁRIO DE MEMÓRIA OU ASSOCIAÇÃO LIVRE]

Jordana Machado
3 min readSep 7, 2019

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Uma bailarina fumando o primeiro Marlboro vermelho no banheiro de uma colônia de férias em Caraguatatuba.

Um risole e dois pirulitos de coração na hora do intervalo do Maria José em 1998.

Uma cobra nas pedras de uma cachoeira em Juquitiba.

Uma tabela de basquete na casa de frente pra floresta no Embu das Artes.

A prima e o Planet Hemp que tocou naquela festa em Blumenau.

Aquela vergonha na aula de matemática da professora Ana Maria que também era advogada.

A sandália linda e com cheiro de bosta de cavalo na aula de Inglês. No avançado da Fisk traduzia-se letras do Blur e do Moby. A professora Simone disse que coisa boa não tem nome composto, Blur, Moby, Prince, Madonna. Nessa época entrava no Disk MTV a banda Cantos dos Malditos na Terra do Nunca. Simone Moreira Deblin não sabe de nada.

Gárgulas e palhaços numa noite do terror do Hopi Hari ou como gastar dinheiro da pior maneira possível.

Big Mac todo esculhambado do Shopping Light no Anhangabaú.

Trovoa na voz da Juçara Marçal todo dia que chove. E nós moramos em SP.

Andar sete minutos para acessar a área de fumantes do Allianz Parque.

Olha mãe, raspei minha perna. Menina vem aqui que você vai apanhar.

Finalizar o primeiro livro longo e a inserção no universo dos leitores de verdade.

Duas calotas se perdendo de suas rodas na Anchieta quando claramente era pra ter ido pela Imigrantes.

A subversão expressa num cigarro pendurado no beiço ou no cinzeirinho em meio aos botões. Ganhar de dois meninos no Street Fighter na Baixada Santista.

Roupas pretas no Ibirapuera, um jogo de RPG no verão paulistano babilônico.

O menininho de sunga verde e bunda grande, vagava perdido e gritava estava aqui, estava aqui.

O coro de ave-maria e santa-maria nos enterros.

Quanto é o cachorro quente, moço? É nove, fia. O terror e o espanto numa rua qualquer da Vila Madalena.

Usar a furadeira pela primeira vez.

Comer embutidos pela última vez. (mentira)

Você se tornou Jesus quando seis pessoas almoçaram porque você tacou meio quilo de farinha de trigo em dois ovos.

Um robô gigante jogando camisinha pro alto no fluxo da Vila Indiana.

O prazer de estar completamente vestida de azul marinho.

Mandar todas as roupas na Maria pra ajeitar as barras.

Toca Ouro de Tolo num domingo enquanto você apronta sua marmita.

Um cara num clipe com um palito de dente na boca que nem o seu Zé aqui da minha rua.

Crise de pânico quando a boca fica seca porque o tio morreu com sede, a enfermeira não deixou.

Do alto daquele mezanino o topo da cabeça do Alceu Valença no Sesc Pinheiros.

The Doors, Racionais e Arlindo Cruz naquela junkebox da sinuca substerrânea numa paralela da Augusta.

Aquele provérbio pichado num muro da Estação Chácara Klabin.

A crise de espirro no canteiro de obras do Itaquerão. Teve copa.

O parkour improvisado anti repressão na Praça Roosevelt em junho de 2013.

Os miojos de carne com tomate e os escondidinhos congelados na décima desilusão amorosa na Santa Cecília.

A costela fraturada depois de quarenta e sete dias de tosse.

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Jordana Machado
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[Literatura entre colchetes] Instagram: jordanamachado1

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