[ETNOGRAFIA PERIFÉRICA]
Olhando pelo vidro eu via lojas, e lembrei de quando era criança e havia muitos canais em que a programação era cheia de propagandas de comércios. Assistia aquilo e pensava que se um dia eu trabalhasse nesses lugares e chegasse alguém pra entrevistar e filmar eu me esconderia debaixo de alguma mesa.
Vi os galhos das árvores balançando com o vento, e lembrei que quando era criança a professora na escola dizia que a árvore era uma coisa que também estava viva como nós, então eu ignorava o ar e achava que as folhas se mexiam porque a árvore estava mandando, assim como meus braços se mexiam quando eu mandava.
Escuto duas crianças brincando na rua. Uma menina e um menino. Ouço risadas, barulhos de passos correndo, e uma pequena conversa sobre um cachorro que tinha aqui e não tem mais. De repente ela diz: ‘posso falar? posso falar?’. O problema começa cedo mesmo.
Em uma mesma calçada um moço vinha na minha direção, e antes que a gente se cruzasse eu o vi juntando as palmas das mãos em prece e/ou agradecimento, depois passou essas mesmas mãos no rosto com força, alucinado de contentamento ele fechou os punhos na altura do quadril e movimentou os braços pra frente e pra trás, como se comemorasse um gol.
A vizinha arruma um pedaço da sua calçada quebrada com um resto de massa que sobrou da obra na casa dela. Em retribuição você passa a lavar a calçada dela quando lava a sua. Aí cê tá lavando sua calçada e um moleque passa, pisa na mangueira, e você: ‘Ôôôô, fião!’. Ele te mostra o dedo do meio. Em retribuição você mostra seu dedo do meio também. Segue uns 3 segundos de tensão. Os dois dão risada e segue o baile.
Bolo de fubá simples.
Rocambole de carne simples.
Pão de liquidificador simples.
Toda receita que tu joga na internet tem uma versão simples.
Podia ser assim com tudo nessa vida.